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Ex-titular do DP de Uruaçu é afastado do cargo de delegado por doações e desvios de objetos apreendidos em inquéritos policiais

Rafhael Neris Barboza, que hoje atua em São Miguel do Araguaia, teria cometido crimes de peculato e falsidade ideológica quando titular do DP da cidade do Norte: Fernando Martins, atual delegado da cidade, notou as irregularidades quando assumiu DP, em fevereiro

Delegado da Polícia Civil atualmente lotado em São Miguel do Araguaia, Rafhael Neris Barboza foi afastado do direito de exercer as atribuições e prerrogativas legais de seu cargo público nesta manhã desta quarta-feira (9) em decisão proferida pelo juiz Gabriel Lisboa Silva e Dias Ferreira, titular da 1ª Vara Criminal de Uruaçu.

O despacho do magistrado refere-se a supostas irregularidades  que o delegado agora afastado, de 30 anos, teria cometido quando foi o titular da Delegacia da Polícia Civil em Uruaçu, a primeira unidade da PC que assumiu após ser aprovado em concurso público do Governo do Estado de Goiás.

Ex-policial militar no Distrito Federal, o delegado ganhou notoriedade na imprensa do Norte do Estado e em veículos de comunicação da capital depois que o Portal Excelência Notícias detalhou que ele, dentre outras coisas, reformou o prédio da DP de Uruaçu com recursos do próprio bolso, tendo investido cerca de R$ 15 mil na obra.

Porém,  na denúncia oferecida pelo Ministério Público (MP) de Uruaçu, a promotora Daniela Haum de Araújo Serafim atestou que o então delegado da cidade do Norte do Estado teria desviado – do interior da DP, sem autorização judicial – objetos que haviam sido formalmente apreendidos em decorrência de cinco inquéritos policiais que estavam em andamento; ou que eram parte de processos que já haviam sido enviados ao Fórum de Uruaçu.

Por esse entendimento, a promotora denunciou Rafhael Neris pela suposta prática dos crimes de peculato; de falsidade ideológica; e prevaricação.

Peculato, vale ressaltar, é o crime cometido por funcionário público no exercício do cargo, em proveito próprio ou de terceiros.

No caso em questão, o então titular da DP de Uruaçu teria se valido de sua autoridade como delegado para desviar e/ou doar, para terceiros, um total de cinco telefones celulares; uma televisão; e uma geladeira, sem prévio aval do Judiciário para que adotasse tal medida.

No caso específico do desvio da televisão apreendida – que Rafhael Neris teria destinado para uma igreja evangélica de Uruaçu – o MP apontou cometimento de crime de falsidade ideológica pelo delegado agora afastado.

Isso porque o aparelho que a igreja recebeu era de marca e modelo diferente do relacionado pelo então delegado no Termo de Doação.

Ou seja, Rafhael Neris assinou um documento que não condizia com a realidade da doação realmente efetuada.

Isso sem contar que um desses aparelhos – aquele que a igreja ganhou mas não levou – teve destinação desconhecida até o presente momento.

As irregularidades que teriam sido praticadas pelo então delegado de Uruaçu no exercício do cargo, apontam que, dos quatro aparelhos que eram objeto de um mesmo inquérito policial, apenas um celular foi formalmente mencionado em outro Termo de Doação.

Não havia, no referido documento, qualquer alusão ao destino final dos outros três telefones.

No que diz respeito sobre a destinação da geladeira duplex – que estava apreendida na DP de Uruaçu, como parte de outro inquérito – constatou-se que um carroceiro e um outro indivíduo entraram no pátio da unidade policial; e levaram o pesado eletrodoméstico, com a permissão do delegado agora afastado.

Um desses homens já havia prestado serviços comunitários na delegacia e, segundo o que ficou apurado pelo MP, já havia pedido verbalmente para que fosse agraciado com a geladeira que Rafhael Neris tinha o dever legal de zelar, no exercício do cargo.

Por fim, a última prática mencionada na ação criminal em tramitação aponta que Rafhael Neris determinou a incineração de objetos – supostamente redes utilizadas em pesca predatória – também sem autorização judicial.

A DESCOBERTA –  Em fevereiro deste ano, após entendimento da Delegacia Regional da PC em Uruaçu com a Direção Geral da PC em Goiás, o delegado Rafhael Neris Barboza foi transferido para a DP de São Miguel do Araguaia.

Fernando Martins, o atual delegado-titular da PC de Uruaçu, atuava em São Miguel e tinha interesse em trabalhar numa cidade em que pudesse se deslocar para Goiânia com mais facilidade; e com menor tempo de viagem.

Em entrevista ao Portal Excelência Notícias por telefone, a autoridade policial explicou que, quando um delegado deixa uma delegacia e assume outra, é realizado um procedimento administrativo interno, chamado de inventário.

Por esse documento, os delegados são obrigados a relacionar os mobiliários e equipamentos existentes na DP ondem trabalhava; e bem como listar todos os objetos apreendidos em operações pelas polícias Civil e Militar; e que resultaram em inquéritos em tramitação na delegacia de Uruaçu.

Ao fazer a conferência do inventário documentado pelo delegado que lhe antecedeu, o atual titular do DP de Uruaçu  contou que percebeu a falta dos objetos listados no início desta reportagem.

Após formalizar ao delegado-regional, Natalício Cardoso da Silva, que não aceitaria o inventário pela suspeitas iniciais de que Rafhael Neris praticou irregularidades, Fernando Martins instaurou inquérito policial para apurar o caso em desfavor do colega de profissão.

Com base no depoimento de testemunhas – tanto de policiais civis lotados na própria DP de Uruaçu que observavam as práticas ilícitas do então delegado como das pessoas que foram beneficiadas por algum tipo de “doação” indevidas – o atual delegado não teve dúvidas que Rafhael Neris agiu em descompasso com o que se espera de uma autoridade policial.

Dessa feita, Fernando Martins concluiu o inquérito e encaminhou o resultado das investigações ao MP, que denunciou o ex-delegado de Uruaçu ao Poder Judiciário; resultando na suspensão provisória do direito de ocupar o cargo em São Miguel, nesta quarta-feira.

A PALAVRA DO ATUAL DELEGADO – “O doutor Natalício [delegado-regional de Uruaçu] instaurou uma comissão formada pelo delegado de Niquelândia, doutor Gerson [José de Sousa];  e por outros policiais civis da região, para verificar se essa informação preliminar que eu passei [do desvio dos objetos dos inquéritos] realmente procedia; e essas irregularidades acabaram sendo constatadas. Por isso, minha obrigação, como delegado, foi instaurar o inquérito policial; e descobrimos o paradeiro de alguns objetos que o meu colega [Rafhael Neris] teria repassado; ou se apropriado de forma indevida. Fiquei muito chateado pelo fato disso [os crimes praticados pelo delegado-antecessor] terem ocorrido dentro da nossa própria instituição [a PC]”, afirmou o atual delegado de Uruaçu.

Ainda de acordo com o delegado Fernando Martins, ele encaminhou uma carta precatória à Delegacia Regional da PC em Porangatu, que responde por São Miguel, solicitando que o depoimento de Rafhael Neris no inquérito policial fosse tomado na própria região onde ele estava atuando antes de ser afastado do cargo pelo juiz de Uruaçu.

Comedido, o delegado preferiu não comentar o que Rafhael Neris teria dito em sua defesa pelo fato do caso ser alvo de processo judicial já em andamento. Porém, segundo ele, ficou evidenciado que o MP de Uruaçu não se convenceu do que fora alegado por seu antecessor.

RIGOR – “Temos de agir de acordo com o que prevê nossa legislação penal, seja com um colega de profissão ou com um cidadão comum, porque ninguém está acima da lei. Inclusive eu, se necessário, me coloco totalmente disposto para que seja apurado qualquer procedimento em relação à minha pessoa. O nosso trabalho diário, como delegado, é investigar, apurar e levar os casos ao conhecimento do Judiciário, que é onde se decide se o que foi feito está dentro ou não das normas legais”, completou o atual delegado de Uruaçu.

A decisão do juiz de Uruaçu, além da suspensão do direito de trabalhar como delegado da Polícia Civil, ordena que Rafhael Neris mantenha-se afastado de todas as testemunhas que foram ouvidas no inquérito comandado por Fernando Martins; e que entregue seus revólveres à Corregedoria da Polícia Civil, em Goiânia.

OUTRO LADO – Questionado sobre a decisão judicial que o afastou do cargo de delegado, Rafhael Neris Barboza disse, em mensagem pelo WhatsApp, que soube do ocorrido justamente no momento em que foi informado pelo Portal  Excelência Notícias; e que não iria comentar o assunto, pois ainda não havia conversado com seu advogado.

Em Goiânia, a Divisão de Comunicação e Cerimonial da PCGO enviou resposta à reportagem, onde informa que ainda não foi notificada oficialmente da decisão judicial.

Uma vez sendo comunicada oficialmente, diz a nota, a PCGO tomará todas as medidas necessárias para o cumprimento do despacho dado pelo juiz Gabriel Lisboa Ferreira.

Porém, como Rafhael Neris ainda cumpre estágio probatório por ter assumido o cargo de delegado em novembro de 2018, o Excelência Notícias apurou, em off, existe a possibilidade de que, após procedimento administrativo, ele possa seja definitivamente exonerado dos quadros de servidores efetivos da Polícia Civil de Goiás.

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